A desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) no processo do trabalho vem gerando intensos debates. Afinal, trata-se de um mero incidente ou de uma ação autônoma? A resposta a essa pergunta impacta diretamente a celeridade da execução e a efetividade da justiça social. O risco de “CPCizar” o processo trabalhista exige reflexão crítica. Neste artigo, defendemos por que o IDPJ trabalhista é incidente processual — e não deve ser tratado como ação à parte.
Agilidade e efetividade da execução
No processo do trabalho, a execução representa o momento em que se concretiza o direito reconhecido em sentença. Toda formalidade excessiva nesse estágio pode frustrar a entrega da tutela jurisdicional ao trabalhador, parte hipossuficiente na relação. Tratar o IDPJ como incidente, e não como ação, mantém o fluxo célere da execução e evita entraves artificiais. O artigo 855-A da CLT, incluído após a Reforma Trabalhista, adota o incidente previsto no CPC (arts. 133 a 137), sem alterar sua natureza.
A Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, ao consolidar normas administrativas, reforçou esse entendimento. Em seu artigo 97, veda expressamente a autuação do IDPJ como processo autônomo e determina que o procedimento tramite nos próprios autos. Ou seja, IDPJ trabalhista é incidente processual, com tramitação simplificada, sem necessidade de nova ação, citação formal ou preparo prévio.
Jurisprudência majoritária e segurança jurídica
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho corrobora essa visão. No processo RR-251300-73.2003.5.02.0020, a 8ª Turma do TST afastou a desconsideração da personalidade jurídica de um grupo de empresas por ausência de exame sobre abuso de personalidade jurídica. A decisão destacou que é exigida a comprovação de confusão patrimonial ou desvio de finalidade, conforme o artigo 50 do Código Civil.
No âmbito regional, o TRT da 3ª Região, ao julgar o IRDR 0010099-83.2024.5.03.0000 (Tema 23), firmou a tese de que, na execução trabalhista, aplica-se a “teoria menor” da desconsideração da personalidade jurídica. Basta o inadimplemento do débito trabalhista e a inexistência de bens que garantam a satisfação do crédito para a desconsideração da personalidade jurídica do empregador.
O TRT da 4ª Região também reafirmou que o IDPJ deve ser processado como incidente, nos próprios autos, vedada sua autuação como processo autônomo. A decisão destacou a necessidade de intimação dos sócios para manifestação, garantindo o contraditório e a ampla defesa.
Princípios do processo do trabalho
A CLT carrega em sua essência princípios como a celeridade, a simplicidade, a oralidade e a proteção. Importar formalismos do processo comum, como a autuação de incidentes em apartados, viola diretamente essa matriz principiológica. A Justiça do Trabalho não é menos técnica, mas sim mais eficiente. O uso da teoria menor da desconsideração, baseada no artigo 2º, §2º da CLT e no artigo 50 do Código Civil, dispensa prova de fraude. Basta demonstrar o inadimplemento para responsabilizar os sócios.
Exigir do trabalhador que formule petição inicial autônoma, pague custas e inicie uma nova demanda colide com os pilares do processo laboral. No contexto do jus postulandi, esse caminho tornaria inviável o acesso à Justiça. Portanto, a preservação da simplicidade procedimental é essencial para a concretização dos direitos.
O professor Carlos Coqueijo Costa já alertava: “o desequilíbrio dos sujeitos no processo do trabalho impõe a especialização deste processo, como consequência das peculiaridades do conflito individual”. Esse raciocínio permanece atual. Ao reconhecer que IDPJ trabalhista é incidente processual, reafirmamos o compromisso com uma Justiça que seja acessível, justa e eficiente.
Conclusão
Tratar o IDPJ no processo do trabalho como ação autônoma é um retrocesso. Envolve multiplicar burocracias, favorecer devedores contumazes e dificultar a reparação de direitos. A Justiça do Trabalho tem se destacado exatamente por sua efetividade na execução. Essa qualidade nasce da racionalidade de seus procedimentos, não da repetição do CPC.
Diante disso, é fundamental sustentar: IDPJ trabalhista é incidente processual. O reconhecimento dessa natureza não apenas respeita o texto legal, como também fortalece a tutela do crédito trabalhista. Defender essa simplicidade é proteger o princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no artigo 1º, inciso III, da Constituição. E nisso, o processo do trabalho segue — e deve continuar — como exemplo de eficiência, humanidade e justiça.
Referência: Portal da Indústria – Conexão Trabalho